SSA: A Tarde de 09/11/14
Um dos efeitos mais
trágicos do rodoviarísmo ainda vigente no país são as mortes em carros,
motos e atropelos em nossas cidades e estradas. As projeções para este
ano são de 48.349 mortes. Em números absolutos ocupamos o quarto lugar
nas estatísticas mundiais, só abaixo de países muito mais populosos,
como a China e a Índia ou sem infraestrutura, como a Nigéria. Esse
número vergonhoso resulta da ausência completa de políticas de
transporte público e desmonte dos sistemas ferroviário e da cabotagem no
último meio século.
Assustadora são as taxas de acidentes e mortes
em motos, cuja frota cresce mais que a de carros devido aos
engarrafamentos e facilidade de aquisição. Não temos estatísticas
confiáveis de mutilados no transito, mas este é um dos aspectos mais
graves dessa política que privilegia a produção, financiamento,
combustível e infraestrutura para o veículo individual e nada para os
modais públicos e a bicicleta.
Estive em Moçambique em missão da
UNESCO, pouco depois da independência. Por toda parte havia mutilados, e
continuavam a chegar novos, pois ninguém cadastrou onde pôs as
minas-de-pé. Pude então entender a lógica perversa dessa arma que não é
feita para matar senão para aleijar, pois um mutilado desmobiliza três
soldados: o ferido e dois colegas que vão carregar a maca e lhe dar
socorro. Na guerra do transito, um mutilado significa não apenas uma
baixa senão duas na cadeia produtiva nacional. Pergunto aos economistas
quanto custa à nação este exército de mutilados e em especial quanto ele
onera o sistema previdenciário?
Recentemente foi sancionada a Lei
12.971 aumentando em até dez vezes as multas por infrações no transito.
Mas a eficiência de uma lei não é função do valor das multas, senão de
sua fiscalização. O estado deve compreender que muitas dessas infrações e
mortes se devem aos buracos de nossas vias e à falta de sinalização,
guard rails, acostamentos, fiscalização e educação para o transito. As
nossas escolas de motoristas são moldadas em função de um exame de
habilitação obsoleto, que pergunta sobre sinais, primeiros socorros e
faz a temível prova da baliza. Este último item não traz segurança a
motoristas nem pedestres, senão ao carro do vizinho. Os novos carros
fazem isto automaticamente.
A exigência recente dessas escolas
instalarem simuladores foi regulamentada de forma equivocada, como uma
previa ao início do aprendizado e não como o termino, simulando a
direção em auto-estradas, o controle do carro em derrapagem, a direção
sob chuva e à noite. Os recém habilitados ignoram a eficiente
sinalização dos caminhoneiros e que eles não podem desacelerar em
descidas ou subidas para dar passagem a um automóvel em contramão. Que
com o motor desligado o freio de um carro não funciona e nesse caso é
preciso usar o freio motor e de estacionamento adequadamente. Sem dessa
instrução muitos se lançam nas estradas fazendo barbaridades, morrendo e
matando. “País desenvolvido não é aquele que os pobres andam de carro, é
aquele que os ricos andam de transporte público”, como diz Peñalosa,
ex-prefeito de Bogotá, que com Medelín deviam ser exemplos da boa
mobilidade e segurança urbana para nós.
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