SSA: A Tarde, 30/03/14
Os 50 anos do golpe de 1964 tem ensejado reflexões sobre a história
recente da Bahia em periódicos e o recém encerrado III Fórum do
Pensamento Crítico dedicado ao “Autoritarismo e Democracia no Brasil
1964 -2014” iniciativa da Fundação Pedro Calmon. Dois pontos devem ser
ressaltados, o foco na historia recente, e a assunção do pensamento
critico por um órgão publico como fundamental para construir o futuro.
Mas é preciso passar do simples desagravo a estudos mais consistentes.
Quero aqui ampliar este debate com as transformações da nossa
economia no mesmo período. Na década de 1950, quando a economia baiana
patinava, Pinto de Aguiar convidou seus pares a decifrarem o que chamou
de o enigma baiano. Como a Bahia tendo sido um dos maiores produtores de
açúcar e fumo do mundo e pioneira da industrialização não conseguiu se
capitalizar. Recorde-se Fabrica de Tecidos Todos os Santos (1844), em
Valença, Cia. Fabril dos Fiais (1890), a Cia Empório Industrial, de
Luis Tarquinio, e a União Fabril da Bahia, que fundiu cinco pequenas
tecelagens (1891) e Fratelli Vita fabricante de refrigerantes (1902 ,
que foi a maior e mais conceituada fabricante de cristais do Brasil.
Hoje são só ruínas.
No ciclo do cacau tivemos grandes produtores
a exportadores, como Wildberguer, Barreto de Araujo, Correia Ribeiro e
Chadler que quebraram muito antes da vassoura de bruxa. Correia Ribeiro,
além do cacau, tinha um banco, uma construtora, lojas de materiais,
postos de gasolina e supermercados. Tentando superar esse paradeiro,
Oscar Cordeiro foi buscar petróleo em Lobato em 1937. A dois outros
baianos, Landulfo Alves e Rómulo Almeida, este um dos fundadores da
Petrobras e da CPE, se deve a implantação da Indústria petrolífera na
Bahia em 1949 e seus dois filhotes, o Centro Industrial de Aratu e o
Copec.
Com o ciclo da exploração do petróleo e atuação da
Sudene, surgiram algumas industrias na Bahia de grande porte que
acabaram quebrando ou sendo vendidas para o sul. Podemos citar a Usiba,
hoje Gerdau; Sibra/ferro-ligas, agora Vale/Usiminas; Cimento Aratu hoje
Votorantim, apenas moendo “clinquer”; Alimba, hoje Parmalat. Outras
fecharam, como a Sambra de óleos vegetais; Opalma, maior fabricante de
óleo de dendê; Elevadores Amoedo; Ceramus, fabrica de azulejos; Cesmel,
estrutura de aço; Incabasa, carrocerias de ônibus; Ralf, de moveis;
Poliflex, luminárias, etc.
No comercio firmas mais antigas se
fecharam, como Florentino Silva, Buriti, Correia Ribeiro, Schindler e
Adler, Duas Américas e Nova America. No setor de alimentos Eurico
Magalhães, o rei do açúcar, Manuel Joaquim de Carvalho; Costa e Filhos,
A. Vasques e Cia, José Martins e Cia, Raul Schuab e Cia, fundador da
primeira rede de supermercados, e Mamede Paes Mendonça que chegou a ser o
terceiro no ranking.
Perdemos tudo a partir dos anos 60. Este é
o novo enigma baiano. Seria precipitado dizer que tudo se deve ao
golpe. Outros fatores podem ter influído, como a inflação dos anos 70 e
80, os problemas de sucessão dentro da empresa etc. Mas a tônica de
Delfin Neto de primeiro acumular para depois distribuir, o fechamento de
agencias de desenvolvimento regional, como Sudene e Sudam, e de
planejamento na Bahia, a CPE, e o exílio da elite intelectual que
imaginava um projeto de nação com reformas de base e planejamento, com
homens como Celso Furtado, Anísio Teixeira, Rômulo Almeida e Darcy
Ribeiro, são na maior parte responsáveis por essa razia.
Na
Bahia o autoritarismo perdurou por mais vinte anos, como uma disputa de
um grupo emergente contra aqueles que lhe serviram de degraus pelo
domínio político e econômico do estado. Assim deve ser vista a venda do
Banco da Bahia, a quebra do Econômico, a disputa pelo espolio dos
Diários Associados e sinal da Globo, o fechamento do Jornal da Bahia, a
alienação do território municipal, a falência de empresas tradicionais
de construção, como Comercio e Imóveis, Concic Portuaria, Comeba e Sisal
e a formação de um novo cartel de grandes empreiteiras. Em suma, a
concentração do poder econômico. Este é outro aspecto do golpe de 64 que
precisa ser estudado.